03 outubro, 2014

Saramago, e o que se diz ser um meio-livro ("Alabardas", está lido)

Isso, já lido. Li-o no sábado passado, de um fôlego, de um jacto e sem ter parado. Estranho isso, pois há muito que não consigo ler um livro de rajada. Aquele recato que tinha, aquele sossego de espírito e reserva de concentração para devorar palavras, pensá-las e repensá-las... tinha perdido isso. Por cada livro que pegava, pensava: é agora!, e não era. Depois de uma dezena de páginas, já estava a pensar nas tarefas, na intervenção que tinha de preparar. Mais meia dúzia de folhas, e já não se me tirava da ideia as escolas fechadas, os professores por colocar e os enfermeiros a duplicarem horários e as pilhas de processos fora do sítio porque o Citius empanturrou. Mais uma dezena de parágrafos e um voltar atrás para poder continuar e lá me vinham à ideia um mar de assuntos, temas e alguns fantasmas que não me largam. A guerra e as crianças despedaçadas faziam-me desertar da leitura. Como ler tranquilamente com o sangue de crianças a ocupar-me a mente? Como ter concentração e ripanço para poder dedicar a um livro a atenção e o respeito merecido? Até pegar em "Alabardas" não passava de meio-livro. Este li-o inteiro, talvez porque seja apenas meio. E só depois de ler as 66 páginas é que a inquietação e o desassossego me invadiram. E foi um desfiar de memórias, ao tempo em que os escritores não se escondiam atrás da sua obra e saíam à rua...
"Nunca separei o escritor da pessoa que o escritor é. A responsabilidade de um é a responsabilidade de outro." (escreveu Saramago a propósito de alguém que não quero trazer ao caso). E ei-los, de corpo inteiro, na obra como na marcha, com a coerência de ter de bater a coincidência entre a obra e a vida:
Marcha pela Paz,1983. Da esquerda para a direita: José Saramago, Piteira Santos, Maria Rosa Colaço, Lopes Graça, Manuel da Fonseca, José Cardoso Pires e Urbano Tavares Rodrigues.(foto Rui Pacheco)
Falar do livro? Sim (como a nossa imprensa não falou)!
Merece ser lido? É um libelo!
E devia ser distribuído, como um panfleto em defesa da paz!

4 comentários:

  1. Ainda não li mas está na calha!

    Beijinhos Marianos, Rogério! :)

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  2. Também estou com alguma curiosidade tanto mais que gosto da escrita de Saramago!

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  3. pois bem - sinto-me convocado a ler com urgência.

    abraço, caro Rogério

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