31 maio, 2015

A segurança social acaba se a omissão e o wrestling continuarem a enganar o pagode

Os dados ao lado são do Expresso, jornal que a Minha Alma recomenda expressamente não ler (mas nem sempre seguimos o que a nossa alma recomenda), e que vejo repetido num outro lado, sob um título expressivo:

segurança social, ponto da situação: acaba em 2030


Dá o citado por certo que as propostas conhecidas, que o citado ignora, nem serão discutidas, talvez porque ele (também) esteja enfeudado às maiorias encontradas de entre os que decidem, no chamado "arco do poder"... 
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«Questionado sobre a forma como pretende resolver o problema da sustentabilidade da Segurança Social, o PCP enviou uma resposta ao PÚBLICO na qual destaca quatro medidas: Uma é a “eliminação das isenções e reduções da TSU que fazem perder mais de 500 milhões [de euros] de receitas por ano”. Outra passa por combater e recuperar as “dívidas à Segurança Social, que cresceram enormemente com o Governo PSD/CDS-PP, devendo ultrapassar largamente os 10.000 milhões de euros”. A terceira pretende completar o actual sistema de cálculo das contribuições com um outro baseado no lucro das empresas, ou seja, as grandes empresas, com lucros superiores a meio milhão de euros, contribuiriam mais para o sistema. A quarta passa por reforçar o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social através do imposto de 0,25% sobre as transacções financeiras. A estas medidas associam-se outras como a aposta na produção nacional, na criação de emprego, no aumento dos salários e do salário mínimo nacional.»

Não sabemos se outros terão respondido ou se limitaram as respostas ao wrestling com que distraem fazendo aparências de luta quando estão de acordo nas questões de fundo.

29 maio, 2015

inCoerências


Ele topa-o. Adivinha-lhe o que lhe vai na alma.
O outro sente-se topado e adivinhado.
O inquérito prossegue e quando finda ele elogia os factos apurados, o rigor do detalhe, o escrito no relatório final. Mas vota contra. Por sinal, o único que vota contra, que aponta o que aponta e afirma que as conclusões são omissas quanto às responsabilidades políticas.
Dias mais tarde Carlos Costa é reconduzido no cargo. Nada consta o contrário no seu passado que contrarie esta nomeação política. Nada! Um único voto contra, não conta. Há pegas, discordâncias, mas que se esbatem e anulam na incoerência de quem, ao fim e ao cabo, também defende o sistema não votando contra. Triste cena. Que pena...

28 maio, 2015

Ampliar as Fontes de Financiamento da Segurança Social...


Desde os anos trinta, com o libelo de Chaplin contra a desumanidade do sistema capitalista, que as formas de exploração não têm parado de evoluir. E se é certo que o "taylorismo" está ultrapassado não é, contudo, menos desumana a sanha que se lhe seguiu da procura do sucesso e do lucro. Na verdade, não são as condições de trabalho, a racionalização das pausas e horários e a redução do esforço humano que tem determinado a evolução dos processos, designadamente os processos produtivos e, dentro destes, os processos industriais. O que tem determinado tal evolução, é tornar os processos menos dependentes do factor mão-de-obra. Reduzir a componente "custo do trabalho" no valor incorporado ao produto, tem sido a preocupação dos patrões da indústria e dos accionistas.  Preocupação que tem tido boas respostas no desenvolvimento de tecnologias da automação, da robótica, da  inteligência artificial, das "células por tecnologia", entre outras. A indústria automóvel foi, durante muito tempo, o exemplo disso e administrações mostram, orgulhosas, aos accionistas naves pejadas de dezenas de robots sem que se aviste vivalma. Nos Tempos Modernos de hoje podemos observar que nenhum sector escapa a essa lógica, nem sequer a indústria alimentar, para já não falar da "desmaterialização dos processos administrativos". O sonho das administrações, dos accionistas, é obter o objecto do lucro sem empregar pessoas. As máquinas não engravidam, nem se sindicalizam... nem pagam TSU nenhum.
Mas com a iniciativa hoje conhecida isso poderá mudar. Felizmente que alguma imprensa a explica.
Vai ser chumbada? Não me admiraria. Mas fica a semente...

27 maio, 2015

O poeta e a coerência de quem nunca escreveu um verso

«Não este não arrisco logo existo / de cócoras à espera de uma sopa. (...) / Pátria minha quem foi que te não quis?» - Manuel Alegre, in "Resgate"
«Não defendemos isto (saída do euro) como ato súbito. O que dizemos é que temos a obrigação de nos preparamos, como um processo, não como um ato súbito.» - Jerónimo de Sousa, entrevista TVI

Há homens, que nunca tendo escrito um verso, são mais poetas que alguns poetas que eu conheço. A tais poetas requeiro que a alma seja conforme com a palavra, com coerência e sem ressalva. Não há, neste comentário, nada de pessoal, demolidor. Não senhor. É um comentário de esperança de que o homem seja conforme o verso. 
Jerónimo? Esse é a coerência de sempre, que um precedente encoraja e a nossa luta anima!

26 maio, 2015

O que a imprensa não mostra não acontece!


Esta imagem, ou outra, vai aparecendo. Dia a dia nos é mostrada e a vamos vendo. O efeito é condoer, provocar o gesto condoído e estendido de dar o que a si lhe sobra, o que não lhe faz falta, ou o que você cede em nome da salvação da sua própria alma. O que não aparece é a razão de tudo isto, como se tudo isto acontecesse sem razão para acontecer, como se tudo isto fosse por ter de ser, resultado do não se sabe bem o quê...
Fica, nesse silenciamento da razão, um sentimento de culpa. Uma expiação de um pecado cometido. Um "ter vivido acima das possibilidades"...
Mas, em treze minutos tudo se explica. Tudo, até uma saída!

25 maio, 2015

Poesia (uma por dia) - 78

"Der Weg zur Sonne"- Galina Sorochan
Acusam-me de mágoa e desalento
Acusam-me de mágoa e desalento,
como se toda a pena dos meus versos
não fosse carne vossa, homens dispersos,
e a minha dor a tua, pensamento.

Hei-de cantar-vos a beleza um dia,
quando a luz que não nego abrir o escuro
da noite que nos cerca como um muro,
e chegares a teus reinos, alegria.

Entretanto, deixai que me não cale:
até que o muro fenda, a treva estale,
seja a tristeza o vinho da vingança.

A minha voz de morte é a voz da luta:
se quem confia a própria dor perscruta,
maior glória tem em ter esperança. 
Carlos de Oliveira, in 'Mãe Pobre'
(Post inteiramente transladado do Bio Terra)

24 maio, 2015

Geração sentada, conversando na esplanada - 89 ("Não se pode fazer da Educação um acordeão de romaria que se abre e se fecha ao sabor das ideologias e dos interesses dos "pensadores" de meia tigela sedentos de eternidade.")

(ler conversa anterior)
«...A escola tradicional azedou, passou à história, está longe das exigências das sociedades de hoje e mais longe dos ideais de uma Escola inclusiva, uma Escola para todos. Os defensores do mito do passado, sabem bem o que fazem, o que querem...
Não se pode fazer da Educação um acordeão de romaria que se abre e se fecha ao sabor das ideologias e dos interesses dos "pensadores" de meia tigela sedentos de eternidade. É um crime!»

Lídia Borges, num comentário à "Redacção do Rogérito..."
"Os socialistas já não vão acabar com os exames nacionais para os alunos dos 4º, 6º e 9º anos de escolaridade. A introdução de exames no fim de cada ciclo escolar (4º, 6º e 9º anos) foi uma das medidas tomadas por Nuno Crato que os socialistas mais criticaram, desde que entrou em vigor em 2012. Por várias vezes, o PS teceu duras críticas aos exames e chegou mesmo a acusar o ministro da Educação de querer voltar "à escola elitista". O ex-ministro da Educação Augusto Santos Silva defendeu várias vezes o fim dos exames no básico."
Ana Petronilho, no "Económico
 

O filho da Rita veio à frente, só depois ela apareceu para se juntar ao grupo das professoras. "Então, correu-te bem a prova?" O miúdo respondeu com um "mais ou menos" distraído mas sublinhado com um encolher de ombros significativo, para de seguida abraçar o cão. Eu e o engenheiro ficámos olhando a cena, sem a comentar. Já nos conhecíamos o suficiente para sabermos que ambos estaríamos a pensar no  acordeão de romaria a que se referira a Lídia.

22 maio, 2015

Redacções do Rogérito 24 - "O meu exame serviu para o professor ser avaliado e o senhor director ficar enrascado"

Tema da redacção: Os Exames

Eu gosto muitos de exames e de ser examinado pois é uma oportunidade de eu demonstrar que sou melhor que os outros e dos outros demonstrarem que são melhores que eu porque dos piores de todos não rezará a história até porque quando abandonarem a escola ficam sem pena de sair porque a aprendizagem era coisa para que não tinham vocação e assim o abandono escolar fica mais que explicado sem que ninguém se sinta culpado a menos que seja um menino endinheirado mas esse não sai para o privado.
O exame é também uma forma de os meus professores não ficarem a armar-se em doutores e de serem também eles avaliados e de os directores ficarem enrascados se não forem bons os resultados e descobri que isso era assim pois deram suspiros de alívio quando fui entregar a prova cedo e eles a olharam com medo mas depois foram-na lendo e o sorriso foi-se abrindo e até me disseram que eu era um lindo menino.
A pressão sobre a escola só dá para perceber hoje pois agora não basta chegar à quarta classe e saber ler escrever e contar como nos tempos do senhor Salazar que também era professor e os exames eram uma boa forma de provar que os meninos sabiam ler escrever e contar e que os professores sabiam ensinar pois até era raro algum menino ficar reprovado mesmo se tivesse muitos erros no ditado se lesse bem e tivesse metade das contas certas também.
Eu até ando cá com umas ideias de que se a escola voltar aos tempos do senhor professor Salazar que se forem bem organizados os exames todos andarão felizes como dantes.


21 maio, 2015

Sobre "o ter Culhão" (...e o resto é só preguiça e covardia)

Voltei a ver o vídeo de ontem, depois de ver este, e cheguei a uma conclusão diferente: o homem não estava a dissertar sobre Deus, mas sobre o que Marx escrevera sobre Deus. Mas fê-lo com tal veemência, com tal sofreguidão e entrega que me ficou essa impressão. Mas ele não falava sobre Deus, não. É que sobre o que ele pensa de Deus, não importa. Ele, segundo ele, não conta. Marx, sim. E muito. Daí o calor que ele deu à aula. Hoje é o contrário, ele não fala sobre Kant, ele fala sobre outra coisa! E que coisa, meu Deus, que coisa!
Acho que me vou encher de brio e... ler "O Capital". A ver se tenho culhão para tal?

20 maio, 2015

Deus!


Não o procurei, veio ter comigo (o vídeo) pela "mão" de um amigo. Depois fui ver quem era, e dei com o seu perfil, fiquei a saber que era professor livre-docente na área de Ética da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP) e coordenador do programa de mestrado da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e que é autor de inúmeros livros. Dele próprio fala assim:  
«É que eu adoro o que eu digo. É impressionante como eu me encanto com o que o eu mesmo falo, é impressionante o quanto eu entendo quando eu mesmo explico. Porque tem gente que condena, as pessoas consideram isso arrogância. Mas pare para pensar: Se você vai ter que conviver com você mesmo até o fim, se você vai ter que se aguentar até o fim, se você vai ser espectador de você mesmo até o fim, é melhor que se encante com o que faz.»
Clóvis de Barros Filho

17 maio, 2015

Bicampeões, já!

«Saindo da lição aos netos, fico pensando noutra que retiro para mim próprio: a alienação para ser eficaz precisa de ser praticada por gente capaz, pois só assim produz efeito. Mesmo que à custa de muito dinheiro. A imprensa, bem oleada, trata do resto.»
 Me assino, O Mouro 
(não confundir com o Mourinho)

Luanda 1970 e o pagamento de uma promessa


Hoje o texto editado é o pagamento de uma promessa, uma retribuição. Prometi à Elvira, amiga recente, que lhe falaria da "minha" Mutamba e de como eu via Luanda. É também um incentivo ao seu trabalho, pois ela talvez até nem saiba que um dia este espaço foi um laboratório da palavra, do qual saiu um livro abraçado pela cumplicidade de quem me comentava (Almas Que Não Foram Fardadas). Eis algumas das suas páginas, eis o pagamento daquela promessa:
«74 – Luanda, numa sexta-feira santa – A chegada a Luanda, que lembre, não teve história. Dizia-me o calendário que era dia de comemorar a crucificação e de sofrer com Cristo o que este terá feito para, conforme todos os catecismos, salvação dos homens. Mas a memória nada mais regista dessa chegada do que os cheiros diferentes e o ar, que fresco por terras de Maquela, se tornara quente, húmido, verdadeiramente tropical. Minha Alma e Meu Contrário queixam-se da mesma amnésia e referem uma muito leve lembrança do conforto sentido à chegada a uma cidade onde nos parecia nunca termos estado, apesar de ter sido aqui que tudo começara, cerca de oito meses atrás, um dia depois da chegada do homem à lua e do meu trocadilho inspirado: a Lua… anda. Lembrava o «comboio malandro» e as crianças dos musseques.
Dessa passagem, resta agora a ténue lembrança de ter sido dispensado de estar presente na devolução do material sanitário a meu cargo e de quem o haveria de recepcionar, tomando o sargento Meia Alma o meu lugar. Não me lembro de nada, mesmo nada, nem mesmo o momento em que nos foi comunicado o novo destino e as palavras tranquilizadoras que terão sido ditas para nos sossegar quanto a esse lugar, no planalto central angolano do Bié, com nome de brincar: Nharea. Vila pequena, um pouco a norte das cidades de Silva Porto e de General Machado, todas livres de acções de guerra, e onde a presença militar era requerida como força dissuasiva. Minha Alma ter-me-á dito: «Nharea? Terra baptizada por preto só pode ser é feia», pois em Angola nomes dados eram na sua maioria dos colonizadores e não dos colonizados.
Com a notícia, embora nada lembrando, não será agora difícil imaginar que todos os militares da minha unidade teriam, em conflito com a data comemorada, a sensação de terem sido libertados de uma cruz sem a certeza de não lhes estar sendo preparada outra. Entre esse sentir e a incerteza, prevalecia certamente o momento. E esse, por ser de contentamento, tinha de ser vivido intensamente e noite fora festejado e… regado.

76 – Domingo de Páscoa, inicio da manhã. – Se há situações que não lembro, outras estão presentes como se vividas há pouco. Nessa manhã esperava, na Praça Cidade de Luanda (a que todos chamavam Mutamba), meus dois camaradas de relação mais chegada. Tinha planeado o dia: manhã na praia, tarde para conhecer a cidade e à noite telefonar para casa e depois o que a emoção permitisse. Enquanto esperava, dispersava a atenção pela ampla praça, pelos edifícios que me pareciam imponentes, por quem passava, pelo intenso movimento do tráfego.
De início, não fazia juízo sobre o que via. Limitava-me a ver. Depois, com a espera demorada, fui dando atenção a pormenores: As acácias de um rubro garrido, no meio da praça a dar-lhe graça; a frequência de chegada e partidas dos machimbombos (...); o modo de estar e de falar gesticulado, de pequenos grupos, pretos com pretos, brancos com brancos, um pouco por todo o lado; o trânsito de muitos carros japoneses, modelos nunca vistos e porventura recentes conduzidos por brancos e orientados por um sinaleiro… branco. A passagem de um carro da Polícia Militar trouxe-me à realidade militar da guerra que aquela cidade não parecia estar. Mas foi no sinaleiro que me fixei. Nunca percebi o prazer de ver um sinaleiro e dei por mim a preencher a espera com interrogações idiotas, do tipo: «Porquê um branco e não um preto, se estava na capitalangolana?» Meu Contrário e Minha Alma, distraídos com outras imagens e pensares, não me respondiam e esforcei-me eu por encontrar a explicação: «Seria a suprema humilhação do colono ser parado e orientado por um colonizado.»
Sorri para mim, quando ouvi uma voz conhecida: «Tás feliz pá, corre-te então bem a vida.» Eram eles, atrasados, mas a tempo de partirmos para a ilha, para uma manhã de praia, conforme o combinado. (...)
77 – A perfeita e inesperada integração racial. – A praia a que chegámos estava pouco menos que apinhada. Páscoa, dia de feriado era uma das causas. A outra, o tempo convidativo, quente, como quase sempre. Não vou perder tempo descrevendo atitudes normais de quem como nós, afastados meses a fio de lazeres, de corpos desnudados de mulheres, de enleio de olhares e maneios insinuantes, aparentemente convidativos mas, de facto, distantes. Falo da estranheza, comentada entre nós três, de nem um negro se vislumbrar, nem no areal, nem à beira-mar. Lá bem dentro da água calma, sim. A uma distância prudentemente afastada de reprimendas, nadavam e brincavam. Sobre uma barcaça, lancha, ou que fosse que se tinha virado, um grupo se divertia. Subiam ao bojo da embarcação e de lá mergulhavam, uns com estilo, outros a macaquear sabe-se lá que pequenos demónios aquáticos que, na frescura tépida do Atlântico, encontravam omissas vítimas ou sereias que se esgueiravam sem se deixarem apanhar por aquele esbracejar. Faziam-no incansavelmente e durante o tempo que durou o nosso quase igual devaneio, mergulhando e nadando por ali entre ondas e mar de gente da nossa cor. Longe estava a Senhora do Mar que só serve a navegantes e não a conjunturais veraneantes. Após o banho de mar, o banho de sol. Silenciosos, todo o tempo, até os corpos se enxugarem e um se atrever a lançar assunto, o que aconteceu: «Rico dia», disse o Alma Redonda, para não ser ele a puxar conversa, mas a incentivar a que um de nós o fizesse. Fê-lo o Alma Séria, interrogando-me: «Rogério, que dizes? Não vamos ter isto em Nharea, mas teremos certamente mais sossego que lá no Norte.» Respondi, lembrando-me do que Minha Alma tinha já dito, repetindo a sua ironia: «Nharea? Terra baptizada por preto, só pode ser feia.» Rimo-nos todos e relembrámos tempos há pouco passados, as deslocações ao Quitexe, as emboscadas por que eles passaram, os medos e as mortes. Alma Redonda atalhou assunto, achando o tema do passado totalmente deslocado do prazer de ali se estar. (...) Estávamos assim nesta cavaqueira, quando da praia um grito e um gesto na direcção do mar fez, para aquele sítio apontado, toda a gente olhar:
«Tubarão, tubarão, tubarão!»
Alguns gritos e grande confusão. Confusão no areal e lá no barco emborcado, onde o bando de negros tinha estado a saltar. Toda a gente via, sem bem notar, se barbatanas, se caudas, se dorsos, se tudo isso misturado num numeroso cardume de, fosse o que fosse, o certo era ser de grande volume. Os braços negros, freneticamente nadavam. Os braços brancos, da praia, freneticamente chamavam: «Fujam, fujam para aqui»; «venham, venham»; «nadem, nadem.» E nadavam desesperadamente na direcção do areal de onde os gritos, aflitos, se continuavam a ouvir num espectáculo um tanto desproporcionado com a distância a que ficava o tal cardume. Já o primeiro negro chegara ao areal e ainda estava bem longe da barcaça o primeiro dos supostos tubarões. Correu um ou outro branco a amparar um e outro negro, esgotado pelo esforço. Correu também o Alma Redonda também a socorrer, enquanto se ouvia alguém dizer: «Raça canalha. “Turras” do caraças. Pena os tubarões não os paparem a todos.»
Ainda não estava tudo isto dito, quando os peixões começaram a saltar harmoniosamente. Uns em saltos alongados, outros para o ar, parecendo gozar com o sucedido. Sempre me tinham dito que os golfinhos eram inteligentes, mas nunca me disseram que tinham tão sarcástico sentido de humor e tão elevada eficácia em diligências apaziguadoras:
«Faltam em terra golfinhos para continuarem a tarefa de tão perfeita solidariedade e integração racial», sentenciou Minha Alma com o ar mais sério deste mundo…» 
79 – A cidade é como uma mulher? – Saí da messe de sargentos ainda o calor abrasava, disposto a ir cidade fora, na tentativa de a conhecer. Já sabia da impossibilidade de conhecer uma cidade só por lhe percorrer as ruas, ainda que atento a tudo e a todos. (...) Passados uns minutos, poucos, estava na Mutamba, olhando de novo os machimbombos. Resolvi então tomar um deles, destino a Vila Alice, nome de mulher. Poderia assim ter uma ideia de parte de Luanda, já que resolvera ir e vir e depois escolher outro destino, dos que dali se aprontavam e partiam: São Paulo, Bairros da Cuca, Prenda, Popular, foram os usados. Assim percorri avenidas e ruas, a esmo, olhando para o que havia para olhar, foi como percorrer veias de um corpo desconhecido, sentindo-lhe a alma distante e o pulsar do coração ausente, sem ver uma e outro. No fim do dia, fiz o balanço. Se Luanda era mulher, era estranha. Mulher branca na baixa, branca e loira na parte alta, com pernas e braços de mulata. Gente negra, pouca vi, certamente enfiada numa periferia pobre que o «comboio malandro» não me chegara a mostrar na totalidade.»

"Celebrar a vitória, defender a Paz" e o que lá se disse entre o muito que se foi dizendo...


Não cabe neste espaço, onde muitos são os que passam com passo apressado, entrar nos detalhes, descrever o que foi ouvido, a não ser no seu sentido. Na sala, quase cheia, os lugares foram ocupados depois de inaugurada a exposição, guiada por quem a montara. Os antecedentes da primeira guerra, a primeira guerra, o que acontecera até à segunda, esta, e o que a ela se seguiu, foram a introdução do que ouviria a seguir, depois de passado o vídeo.
Do que foi dito, registo, avulso, vaticínios e alertas:
  • Têm-se reforçado, na Europa, os movimentos para a Paz. Na Irlanda, o Sinn Fèin tem tomado várias iniciativas, algumas com o apoio do Partido Socialista... não se admirem se, das próximas eleições, vier a resultar um governo do Sinn Féin;
  • Na Bélgica a policia foi substituída pelo exército, está implantado o medo e a teoria do inimigo interno. O Governo Belga nega o arsenal atómico, mas faz substituir os F16 por caças que podem transportar ogivas nucleares e planeia investimento em naves que permitem o abastecimento aéreo permitindo-lhe alcançar Moscovo;
  • A queda do Muro levou ao fim da "Guerra Fria", e, com o fim desta, iniciou-se a "guerra quente" com os conflitos generalizados. Depois da Jugoslávia, o Iraque, o Egipto, a Líbia, a Síria e, a máquina dos Estados Unidos fabrica, a partir desta, o Estado Islâmico... Se a 3ª Guerra Mundial já não começou, o que é que falta a partir do apoio dado ao estado nazi-fascista da Ucrânia? 
Se e quando a bem documentada intervenção de Rui Namorado Rosa ficar disponível, voltarei a falar desta sessão, até lá convido-os a visitar o site.     



Estive lá... e deu-me confiança ter estado! Confiança e esperança!

15 maio, 2015

O bulliyng e o contexto que o promove...


Quando, há cerca de um ano afirmei que "somos a mãe que tivemos". Soou, então, um magote de vozes discordantes às quais me viria a associar nos comentários com um reconhecimento meu: "A discordância é o caminho mais curto para a descoberta de novas verdades... Querer um filho, não tem o mesmo significado de querer ser mãe... ser mãe é sabedoria de mulher, que nem toda a mulher quer..."
"A mão que embala o berço governa o mundo" é uma simplificação. O que somos, de facto, resulta de um contexto bem mais complexo e das circunstâncias que o determinam. Diria, que somos, primeiro, os pais que tivemos. Mas somos, também, a escola que vamos aceitando, a TV que sintonizamos, os partidos em que votamos... e, repito, o que tanto tenho dito: "se as circunstâncias são desumanas, humanizemos as circunstâncias"

(dedico este post à Joana C. Silva)

14 maio, 2015

Sampaio da Nóvoa e o "padrinho"

José Barata Moura, apadrinhou o novo Doutor da UAlg, Sampaio da Nóvoa.
Do "padrinho" tenho escrito, não muito, mas o suficiente para que se retire por conclusão se tratar de boa gente. Boa gente e animada, desde tempos idos em que estimulava as refeições da gente miúda cá de casa fazendo com que a minha João comesse mesmo a papa.
De Sampaio da Nóvoa, nem falo pois considero, para já, assunto arrumado. E se guardo os discursos de um e de outro é apenas para ir conferindo o que irei, ao longo do tempo, vendo e ouvindo. O que farei? Logo se verá!
E se alguém, maldoso, quiser colocar na pena deste escrevente entendimentos dúbios, desde já declaro que o uso da expressão "padrinho" foi assim comentada pelo próprio:
«Começo – desmanchando a protocolaridade destes actos grandes – por uma pequena declaração de interesses:
Não gosto – nada mesmo – de me ver na farpela de «padrinho».
Sobra-me, no perdigoto, a falta de jeito na calçadeira, para fazer com que o pé encaixado na bota bata.
Ademais, entendo que - na dispensação de uma honra - prima o merecimento endógeno daquele a quem ela é conferida.
Atestados de excelsitude avulsa, benzeduras de padroeiro, patrocínios de tutela – relevam das proclamas do perfunctório.
Um ser humano vale pelo que é. Pelo que fez, e pelo que faz. Pela feição em que acomete as fronteiras do fronteiro. (...)»

13 maio, 2015

Sou crente! Crente na ressurreição da minha gente. E de ser nossa a Utopia, um dia...

Todo o ser humano é crente, crente até na descrença que lhe acrescenta. A prece, essa, raramente se parece. Uns oram de olhos no chão, outros viram o olhar ao céu, outros oram cegos, outros ainda, praticam todas essas modalidades e outras.
Eu oro, olhos nos olhos! É essa a minha maneira de orar.

E agora, será a minha escrita clandestina?

«O Estado nada tem a ver com o espírito. O Estado não tem direito a compelir-me, em matéria estranha ao Estado, a escrever numa ortografia que repugno […].»
Fernando Pessoa, aqui

«A degeneração de um povo, de uma nação ou raça, começa pelo desvirtuamento da própria língua.»
Rui Barbosa, aqui 

«Não há uma língua portuguesa, há línguas em português»
José Saramago, aqui

11 maio, 2015

Empreendedorismo, a doença senil do capitalismo - 3 [The factory school]

imagem retirada deste vídeo
Em Janeiro de 2013, julgava ser o empreendedorismo uma moda. Mas temia o risco de ela se instalar, e escrevia: "A moda do empreendedorismo nasce de mãos dadas com o neoliberalismo, ambos se fundamentam no mito que o valor do homem apenas está no «valor que o "mercado" lhe dá». Por isso é preciso que a moda não passe com a tranquilidade com que as modas passam de moda. O que é preciso, necessário, urgente é que acabemos com ela. É preciso acabar com a moda, agora!"
Em Agosto de 2014, confirmava a suspeita de o empreendedorismo se ter imposto, o DN dava-lhe rosto, dedicando-lhe página inteira divulgando o projecto "EmpCriança". Então, pensei "Vai ser muito difícil sair desta selva".

Hoje, percebi que na selva o "neoliberalismo" teria já ultimado o efeito predador. Estamos próximos do que a escola já fora, embora com outros métodos e bandeiras.
Recordam-se disto?
___________


Nota: Em tempos trocava ideias com quem as ia tendo. Fui lá consultar o que escreviam sobre o tema. Uma fechou a loja, percebendo-se a permissividade, outro a loja fechou, cansado de gozar. Permanece o Terrear, mas (sobre o tema) nem atrasa nem adianta. E é pena.

10 maio, 2015

Empreendedorismo, a doença senil do capitalismo - 2 [Escandaliza-se o mundo com o transporte de um menino dentro de uma mala. Não se escandaliza se lhe é transportada a alma?]


A partir dos seis anos, um caminho completo para o meu neto (julgo que a Maria, pela a distância, está mais protegida, ainda que não tenha disso qualquer garantia). A organização* assegura “voluntários oriundos do mundo empresarial”. Estes seguem  um programa que lhe embalará a alma, que a encaixará e transportará num molde comum e normalizado. O modelo, mete medo, os voluntários ensinarão "o que são as profissões, as finanças, ao desenvolverem ideias, construírem o primeiro plano de negócios, gerirem as suas próprias mini-empresas, os alunos aprendem a tornar-se empreendedores a partir dos 6 anos”. 
Em cerca de 500 escolas, são já 200 mil os meninos que se visa transformar em quadros escravos dos Soares do Santos, Amorins e Belmiros. 
Escandaliza-se o mundo com o transporte de um menino dentro de uma mala. Não se escandaliza se lhe é transportada a alma?
*A JAP é a congénere portuguesa  de uma organização internacional, Junior Achievement, desenvolvida a partir de uma associação criada nos Estados Unidos em 1919 e que actualmente desenvolve acções em 122 países. Têm como associados grandes empresas e instituições. A direcção do ramo português é constituída, entre outros, por representantes dos grupos Mello e Jerónimo Martins, das Fundações EDP e PT e da Sonae (proprietária do PÚBLICO).

09 maio, 2015

Há 70 anos, pouco mais de 2 meses depois de eu vir ao Mundo...

"A 2 de Maio de 1945 o exército da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas tomava o Reichstag. A bandeira vermelha com a foice e o martelo, hasteada por um soldado soviético, ondulava em Berlim. Passados alguns dias, a 8 de Maio de 1945, a Alemanha nazi assinava a sua rendição incondicional. A 9 de Maio o povo soviético comemorava em Moscovo a vitória na «Grande Guerra Patriótica», fazendo esse dia passar à História como o «Dia da Vitória». Tinha terminado a II Guerra Mundial no continente europeu, seguir-se-ia a derrota do Japão imperial no continente asiático."
Texto do Avante, citado pelo Bruno, que edita no seu "Da Peste à Centelha"
documentos históricos dignos de serem vistos
.  
Imagens "cedidas" pelo Herético

"Os soviéticos nunca reclamaram o exclusivo da paternidade da vitória de 1945. Mas foram eles quem mais sofreu com a invasão alemã e teve a capacidade para reverter o sentido da guerra a partir de uma resistência sangrenta e de batalhas como as de Stalinegrado e Kursk, perseguindo os alemães até ao seu próprio território.
Foi com tais resultados que a Inglaterra, os EUA e países aliados de ambos, se decidiram pela abertura da 2ª frente, na Europa e na Ásia no seu conjunto. Se isso não tivesse acontecido, ter-se-ia consumado uma das maiores vergonhas da guerra. Muitos dirigentes ocidentais alimentavam a idéia de deixar Hitler acabar com a Rússia que então eles acabariam com os nazis. Estes diferendos ficaram afastados com a vitória, mesmo que a futura guerra fria já estivesse a funcionar." - escreveu o "antreus"
 

08 maio, 2015

Os "ExtraTerrestres"...

 
Quando passou esta entrevista, disse Meu Contrário a Minha Alma: «erro de casting, só pode ser.» Minha Alma, tão atenta estava, nem lhe ligou... Ouviu, ouviu, ouviu. E gostou.
Eu, também atento, percebi porque razão o Continente promove e patrocina uma família em peso. E recordei aqueles versos do Ary: «E diz o inteligente que acabaram as canções»
Acabar, acabar, não acabaram. Deixámos foi de as ouvir! De todo o lado, tudo o que mexe deve se silenciado...
 

07 maio, 2015

Não TAP os ouvidos... hoje foi dia da rádio

 
Não TAP os olhos, têm-se pedido num momento em que não param de lhes mandar areia. Com insistência, há quem queira ver e fala do que vê, sem que seja visto. Não TAP os ouvidos, oiça isto!

05 maio, 2015

É que existe uma fronteira estreita e ténue entre "azedume" e "amargura"... irei procurar exemplos, para já deixo-vos este


Porque é que este sonho absurdo
a que chamam realidade
não me obedece como os outros
que trago na cabeça?

Eis a grande raiva!
Misturem-na com rosas
e chamem-lhe vida.

                          José Gomes Ferreira

04 maio, 2015

"American Oxygen" é canção de intervenção? É talvez mais, é um documento e um alerta que nos desperta... E a propósito, quantos baltimores se aprestam?

  
Expira-se, inspira-se, respira-se esse oxigénio emanado pelo sonho americano, vendido como império. Essa é a toada cantada. Bela a canção? Nem é essa a questão...
(...)
Eu afirmo, você vê, 
Esse é o Sonho Americano
do adolescente, curtindo
tentando fazer a engrenagem mexer
Mas ele pode ser o que quiser
América, América
Eu afirmo, consegue ver?
É só fechar os olhos e respirar
(...)
Isto é a nova América
Nós somos a nova América
Isto é a nova América
Nós somos a nova América
(...)
(tradução, livre, de uma passagem)

03 maio, 2015

Filhos, hoje o dia é delas...


A memória que fica

Depois do ventre, o seio
O colo
A caricia e o consolo 
O perfume que permanece
Enquanto se cresce
A mão na testa
A mão que tapa
A mão que lava
A mão que trava
(Por aí não, filho)
O sorriso
O ralhete, no momento preciso
E a memória que fica
muito depois da partida
Rogério Pereira

02 maio, 2015

Da TAP, a greve é o que ferve. A privatização segue em lume brando. Eis o que a greve serve... telejornais e jornais fazem extensos relambórios sobre a orquestrada e a dramalhada. E há quem vá no engodo. Nojo! Não TAP os olhos!!!

Sobre a situação na TAP

"3 - O PCP, a propósito da greve dos pilotos da companhia, independentemente da opinião sobre a forma que assume e do juízo crítico sobre algumas motivações que lhe estão associadas e o aproveitamento que suscita, chama a atenção para a operação que está em curso, visando branquear a política do governo, facilitar a privatização da empresa e condicionar a luta e a intervenção dos trabalhadores na defesa dos seus direitos e dos interesses nacionais.(...) O PCP recorda ainda que estamos perante a terceira tentativa de privatização da empresa: a primeira em 2002 com o negócio da Swissair que se tivesse ido por diante teria destruído a TAP; a segunda já em 2012 com o negócio com o dito empresário Efremovich, uma aventura que revela que este governo está disposto a tudo; e, agora, este novo processo. Um percurso que demonstra a enorme irresponsabilidade e submissão ao grande capital de todos os que apoiam e defendem a privatização total ou parcial da TAP, como fazem PS, PSD e CDS, bem como, o papel insubstituível que a luta dos trabalhadores da empresa, mas também de muitos outros democratas e patriotas, na sua defesa..."
Pode ler todo o comunicado distribuído à imprensa e a que ela se dispensa. E pode ir lendo o que de mais houver para ler "Em não TAP os olhos" (de onde extrai essa imagem aí)



A CGTP, a greve na TAP e o alarido...


A jornalista quer empurrar para o que queria ouvir... mas não levou mais nada. E a resposta foi clara, como aliás já tinha sido:

01 maio, 2015

Este 1º de Maio e uma mais que justificada dedicatória


Para vós o meu canto...

Para vós o meu canto, companheiros da vida!
Vós, que tendes os olhos profundos e abertos,
vós, para quem não existe batalha perdida,
nem desmedida amargura,
nem aridez nos desertos;
vós, que modificais um leito dum rio;
- nos dias difíceis sem literatura,
penso em vós: e confio;
penso em mim e confio;
- para vós os meus versos, companheiros da vida!
Se canto os búzios, que falam dos clamores,
das pragas imensas lançadas ao mar
e da fome dos pescadores,
- penso em vós, companheiros,
que trazeis outros búzios para cantar...
Acuso as falas e os gestos inúteis;
aponto as ruas tristes da cidade
a crivo de bocejos as meninas fúteis...
Mas penso em vós e creio em vós, irmãos,
que trazeis ruas com outra claridade
e outro calor no apertar das mãos.
E vou convosco. - Definido e preciso,
erguido ao alto como um grito de guerra,
à espera do Dia de Juízo...
Que o Dia do Juízo
não é no céu... é na Terra!

Sidónio Muralha